O ano era 2008, início do primeiro semestre, meu segundo semestre na UnB, já que entrei no 2/2007. A partir de uma sugestão do querido professor Reinaldo Guedes Machado, fui incluído na chapa que pleiteava a gestão do CAFAU, organizada por veteranos. A sugestão de Reinaldo aos veteranos de me incluir na eleição foi que tinha comentado com ele, dias antes, que eu tinha a ideia de montar um cineclube na UnB, algo que a universidade não tinha naquela época. A reitoria tinha acabado de ser ocupada e protestos dos estudantes contra as graves denúncias de corrupção, e o ambiente na universidade era de tensão política. Esse foi o momento em que nós, recém-chegados à UnB, buscamos entender melhor a história das lutas estudantis, da resistência à ditadura, das mobilizações sociais em defesa do Brasil, da democracia e da própria universidade. Foi então que soube da existência do filme Barra 68, de Vladimir Carvalho. Morando perto da Oscarito, na 407 Norte, fui até lá, aluguei o filme que, como não poderia deixar de ser, achei incrível. Nesse contexto, parecia o momento perfeito para inaugurar o cineclube, que seria na galeria da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, organizado pelo CAFAU, e que portanto surgiu com o nome de CineFAU. A primeira exibição, naturalmente, seria do Barra 68. Logo imaginei que seria fantástico lançar o cineclube com esse filme e, por que não, contar com a presença do seu diretor, que sempre foi uma figura muito ativa cultural e politicamente na cidade. Entretanto, para isso, eu precisava entrar em contato com Vladimir Carvalho, a quem eu não conhecia e naquele momento não conhecia ninguém próximo a ele. Com a típica coragem dos estudantes, fui até a Secretaria da Faculdade de Comunicação (FAC) pedir o telefone do telefone do Vladimir, à época, já aposentado. O responsável pela secretaria, negou, naturalmente, alegando que não tinha autorização para fornecer o telefone de nenhum professor. Insisti, explicando o contexto do evento, mas a resposta permaneceu negativa. Já estava saindo de lá, pensando em como conseguiria contatar o Vladimir, quando um professor da FAC, que eu também não conhecia, e que tinha escutado minha conversa com o secretário, me chamou. Ele me puxou de lado e disse: "O Vladimir vai adorar receber sua ligação. Ele vai gostar do convite. Aqui está o telefone dele." Surpreso peguei o número e logo em seguida liguei para o Vladimir. Nossa conversa por telefone foi ótima, e ele aceitou o convite imediatamente. Um muso acessível! Imagina a alegria que senti, eu, um estudante recém-chegado a Brasília, que não conhecia quase ninguém na cidade, estava prestes a iniciar um cineclube na Universidade de Brasília e, ainda por cima, teria a honra de contar com a presença de um dos maiores cineastas do país em sua inauguração. O evento foi um sucesso: Vladimir apresentou seu filme e, em seguida, participou de um longo e importante debate sobre cultura, política, sobre a ocupação da reitoria que acontecia, ditadura militar, tropicália e, claro, cinema e arquitetura. Desde então, era sempre um prazer encontrar o professor Vladimir Carvalho pela cidade. Sempre que possível, trocávamos ideias, e ele nunca se esquecia daquele jovem que lançou o cineclube com o seu filme em meio à ocupação da reitoria de 2008. Ele mesmo comentou várias vezes o quanto quanto aquele momento foi importante, em um período que a universidade vivia uma fase intensa de discussões e mobilizações. O falecimento de Vladimir Carvalho é uma grande perda. Brasília perde um de seus mais geniais e grandiosos quadros culturais. Espero sinceramente que a luta que Vladimir travou nos últimos anos de sua vida para doar seu acervo e mesmo sua casa a alguma instituição pública, especialmente à UnB, finalmente se concretize. Ele sempre acreditou que sua casa e seu acervo poderiam ser o embrião de uma cinemateca em Brasília. É vergonhoso, e triste ver que, após tantos anos, Brasília e a Universidade de Brasília ainda não tenham encontrado uma solução adequada para receber e preservar esse patrimônio importantíssimo e tão generosamente oferecido ao público. A melhor homenagem que a capital pode fazer à Vladimir, é receber seu acervo e criar uma cinemateca na capital, algo que já deveria ter acontecido há bastante tempo. Texto de Luiz Eduardo Sarmento Presidente do IAB-DF É com profundo pesar que o IAB-DF recebe a noticia do falecimento de Vladimir Carvalho, brilhante cineasta que tanto contribuiu para cultura e o cinema em Brasília. Reforçamos o apelo e a urgência para que o seu acervo e legado recebe o devido tratamento por parte da capital federal e que o seu legado continue contribuindo na formação de jovens profissionais e com a cultura em Brasília.
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O Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamento Distrito Federal (IAB-DF) vem a público manifestar sua profunda preocupação com a descaracterização do edifício da antiga Sede I do Banco do Brasil. Este edifício, de extrema relevância para o conjunto urbanístico de Brasília e para a história da arquitetura moderna, está classificado como uma edificação de interesse de preservação pela legislação que estabelece o PPCUB. Além disso, há dois processos de tombamento relacionados a esta construção. O primeiro processo foi protocolado em 2015, no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR). O segundo processo foi solicitado pelo Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamento do Distrito Federal (IABDF) em conjunto com o CAU/BR, junto à Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal, para o tombamento distrital da edificação. A antiga Sede 1 do Banco do Brasil é uma construção importante e única, representativa do movimento moderno em Brasília. Projetada pelo arquiteto Ary Garcia Roza, o edifício foi inaugurado juntamente com a nova capital. Garcia Roza foi presidente do IAB na época da promoção do Concurso Público Nacional de Projeto para a escolha do Projeto da Nova Capital, e havia anteriormente vencido o concurso para a nova sede do Banco do Brasil no Rio de Janeiro. Nos primeiros anos da capital, o presidente Juscelino Kubitschek convidou Oscar Niemeyer para projetar a nova sede do Banco do Brasil, mas Niemeyer recusou o convite, recomendando que Ary Garcia Roza fosse o escolhido, dado seu mérito por ter vendido o concurso para construção da nova sede do banco na antiga capital. A implantação da antiga Sede I no Setor Bancário Sul é diferenciada, sendo o prédio mais alto dessa área. Sua localização em frente a uma grande praça realça a importância da edificação, em conformidade com a proposta de Lucio Costa para Brasília. Apenas dois prédios tiveram esse tratamento na área central: o do Banco do Brasil, na Asa Sul, e a sede dos Correios, na Asa Norte. Apesar do tombamento federal e distrital do Conjunto Urbanístico de Brasília, o edifício da antiga Sede I do Banco do Brasil, com processos de tombamento em curso e classificado como de interesse de preservação no PPCUB, corre o risco de sofrer mais intervenções que comprometam sua integridade. Diante disso, o IAB-DF solicita ao Governo do Distrito Federal (GDF), que, em articulação com o Iphan, que corretamente e prontamente embargou as obras, adote medidas para impedir novos danos ao patrimônio cultural de Brasília. Nos últimos anos, o IAB-DF tem acionado os órgãos competentes em resposta a denúncias de arquitetos e cidadãos sobre supostas demolições internas no edifício. Também tem questionado o andamento dos processos de acautelamento da edificação. A edificação possui acabamentos e soluções sofisticadas e muito inovadoras para a época em que foi construído, com presença de obras de arte integrada, relação generosa e com o espaço urbano e possui painéis de Athos Bulcão e jardins projetados por Burle Marx, tombados pelo GDF, além de mural em bronze de Bruno Giorgi e murais em cerâmica de Burle. O IAB-DF, por meio de seus representantes no Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural do Distrito Federal (CONDEPAC) cobrou ações da Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Secec-DF), que resultou em ofício do Secretário solicitando o embargo das obras e estabelecendo diretrizes de preservação. Ainda, em conjunto com as entidades reunidas no Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro, acionou o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios para acompanhar o caso.
Reiteramos que a preservação do conjunto urbanístico de Brasília depende da integridade de suas principais edificações, uma vez que não existe preservação urbanística sem que haja preservação arquitetônica. Por isso, continuaremos nossos esforços para auxiliar e cobrar das autoridades competentes a identificação e a preservação dos edifícios mais representativos da arquitetura moderna brasileira no Distrito Federal, sede da capital do país, reconhecida mundialmente por sua arquitetura. Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamento Distrito Federal (IAB-DF) |
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